O PL e o PT se aliaram a lideranças da Baixada Fluminense para reproduzir, no reduto bolsonarista do Rio de Janeiro, a polarização nacional nas eleições municipais deste ano.
A região de 13 municípios com 2,9 milhões de eleitores é vista como termômetro do avanço do bolsonarismo no Rio de Janeiro. É uma das mais violentas do estado e com forte penetração de igrejas evangélicas.
O ex-presidente venceu em todas as cidades da região com cerca de 60% dos votos válidos. O PL pretende ampliar essa vantagem, enquanto o PT busca contê-la.
“O Rio de Janeiro é o berço do bolsonarismo, não só em termos cronológicos, mas também de conteúdo. É muito presente nele a pauta da segurança pública ligada ao punitivismo. O cotidiano violento do Rio e da Baixada Fluminense, em particular, cria um espaço que permite a proliferação de um discurso de combate à violência com mais violência”, diz a cientista política Mayra Goulart, coordenadora do Laboratório de Partidos, Eleições e Política Comparada da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), que estuda as relações políticas da região.
A relevância das eleições na Baixada se amplia em razão da projeção política conquistada pelas lideranças com base eleitoral na região, que têm estendido seu poder de influência por todo o Estado. A principal delas é o deputado federal Doutor Luizinho, líder do PP na Câmara e mencionado como uma das opções para a sucessão do deputado Arthur Lira (PP) no comando da Casa.
Luizinho tem buscado manter equidistância de Bolsonaro e Lula nas eleições municipais em todo o estado, justamente para evitar rusgas com os dois principais partidos do Congresso. Na capital, por exemplo, optou por lançar o deputado Marcelo Queiroz (PP) para evitar uma aliança com o prefeito Eduardo Paes (PSD) ou com o deputado federal Alexandre Ramagem (PL).
Em sua base eleitoral, porém, Luizinho se aliou ao PL. A irmã do deputado, Roberta Teixeira, se filiou à sigla do ex-presidente e será vice do pré-candidato Dudu Reina (PP), presidente da Câmara Municipal de Nova Iguaçu.
“Roberta é uma menina genial. Fez direito na Uerj, uma das primeiras colocadas na Emerj [Escola de Magistratura], e, agora, cursando medicina. Fui contra sua entrada na política enquanto não acabasse o curso, mas é da vontade dela desde a eleição de 2020 quando fez parte do [grupo] RenovaBR”, diz o deputado.
A base bolsonarista também conseguiu atrair um aliado de Lula para a chapa em Duque de Caxias. O deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade) emplacou a mulher, Aline Ribeiro, como vice na chapa de Netinho Reis (MDB), sobrinho de Washington Reis (MDB), forte aliado de Bolsonaro na Baixada.
Na cidade, que tem o maior eleitorado da região, o PT decidiu promover a volta do ex-prefeito José Camilo Zito por meio do PV. A decisão contrariou Aureo, que liderou o blocão na Câmara até meados de junho.
“Lula é de muito diálogo, muita escuta. Só que o PT atrapalha. Ajudei muito o Lula na Baixada. Mas agora inventa de pegar outra candidatura em Caxias. Como se fosse voltar a um passado que não funcionou. Esse erro é no Rio de Janeiro em todas as cidades”, afirma o deputado do Solidariedade.
O PT decidiu não apoiar o clã Reis em razão de seu forte endosso a Bolsonaro. A relação política se aprofundou no episódio da suposta fraude no cartão de vacina do ex-presidente, ocorrida na cidade, segundo a Polícia Federal.
A estratégia petista tem sido resgatar antigas lideranças nas cidades em que não há opções distantes do bolsonarismo. Foi o caso de Zito.
“O objetivo é solidificar em cada cidade um bloco de apoio ao presidente Lula para 2026. Também depende das relações dentro de cada município”, afirma João Maurício, presidente do PT-RJ.
A mesma estratégia foi adotada em Nilópolis, onde o PT filiou para a disputa o ex-prefeito Sérgio Sessim, filho do ex-deputado pelo PP Simão Sessim. O adversário será o prefeito Abraão David Neto (PL), o Abraãozinho, num raro racha entre nomes ligados à escola de samba Beija-Flor, que sempre se reuniram no PP, do centrão.
Em Magé, o PT vai aderir ao prefeito Renato Cozzolino (PP), cuja família domina a política local há décadas.
A estratégia visa ampliar a aliança feita com o prefeito de Belford Roxo, Waguinho (Republicanos), cuja mulher, a deputada federal Daniela Carneiro, chegou a ocupar o Ministério do Turismo. Ela foi mantida mesmo após a divulgação da relação de seu grupo político com milicianos.
Nas eleições deste ano, o PT vai apoiar Matheus do Waguinho (Republicanos), sobrinho do prefeito. O PL vai se aliar ao deputado Márcio Canella (União Brasil), que rompeu com o atual mandatário.
A eleição presidencial de 2022 foi a primeira em que o PT ganhou sem ter maioria no Rio de Janeiro, onde Bolsonaro venceu com 56,5% dos votos válidos, puxados pelo resultado na Baixada.
“Lula e Dilma sempre tiveram boas votações na Baixada. O resultado em 2022 [na região] se deveu à desinformação, fake news por meio de algumas igrejas. Tenho certeza de que a partir dessas alianças e das ações do governo Lula isso vai mudar”, diz João Maurício.
O secretário do PL-RJ, Bruno Bonetti, afirma que a Baixada deu uma “vitória esmagadora para Bolsonaro em 2022” e que o PL vai retribuir os apoios que teve “para manter essa predominância”.
Números da Baixada Fluminense
- 13 municípios
- 2,9 milhões de eleitores
- 22,3% do eleitorado do Estado do Rio de Janeiro, de 13 milhões
- 60,5% dos votos válidos no segundo turno em 2022 foram para o ex-presidente Jair Bolsonaro
- 58,3% x 41,7% foi a menor diferença entre Bolsonaro x Lula, em Duque de Caxias
- 64,3% x 35,7% foi a maior diferença entre Bolsonaro x Lula , em Itaguaí