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Canetas para obesidade: Justiça estende patente da liraglutida por atraso em processo no INPI

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Canetas para obesidade: Justiça estende patente da liraglutida por atraso em processo no INPI

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Uma decisão da Justiça Federal do Distrito Federal reconheceu o direito da farmacêutica dinamarquesa Novo Nordisk de estender a vigência da patente da liraglutida, princípio ativo presente nos medicamentos Victoza e Saxenda, usados no tratamento de diabetes tipo 2 e obesidade. A empresa perdeu a exclusividade da produção do medicamento no ano passado, mas, com a sentença, passa a ter direito a pelo menos mais oito anos de vigência da patente. Ainda cabe recurso, por isso, a sentença não terá implicações imediatas.

Na decisão, proferida em 1º de setembro pela 3ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, o juiz Bruno Anderson Santos da Silva determina a extensão da proteção patentária por pelo menos 8 anos, 5 meses e 1 dia, período correspondente ao que o juiz considerou como mora “desproporcional e injustificada” do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) para conceder a patente (saiba mais abaixo).

A patente do liraglutida caiu no ano passado e, em agosto deste ano, chegaram ao mercado as primeiras versões do medicamento de produção 100% nacional, com a promessa de preços mais acessíveis.

A expectativa era de que o mesmo ocorresse com a semaglutida, princípio ativo dos medicamentos Ozempic e Wegovy, também da Novo Nordisk, cuja patente expiraria no ano que vem. A decisão judicial desta semana, no entanto, abre precedentes para que o entendimento de estender a patente ocorra no caso da semaglutida, que também passou por um processo longo no INPI.

A Novo Nordisk entrou com o pedido de registro de patente no INPI em 2004, mas o processo só foi concluído pelo instituto em 2018. No Brasil, as patentes têm duração de 20 anos, mas esse prazo é contado não a partir do momento em que a patente é, de fato, concedida, mas, sim, a partir da data de início do processo. É por isso que a exclusividade patentária da liraglutida ficou vigente somente até 2024.

Farmacêutica diz que prazo foi consumido pela burocracia

A farmacêutica, autora da ação que culminou na decisão da Justiça Federal, alega que a controvérsia central não era “sobre estender o prazo de 20 anos de proteção, padrão global, mas sim sobre como esse prazo é consumido pela burocracia”.

A tese foi acolhida pelo magistrado, que, em sua decisão, afirmou que o objetivo é “garantir tutela específica diante de uma situação concreta de ineficiência administrativa”. “A demora de mais de 13 anos, sem que se possa imputar qualquer conduta procrastinatória às autoras (Novo Nordisk), configura flagrante violação aos princípios da eficiência e da razoável duração do processo”, afirmou o magistrado.

De acordo com o juiz, as autoras da ação demonstraram que o INPI levou 13 anos, 7 meses e 27 dias para a concessão da patente, tempo no qual houve “dois períodos de inércia por parte da autarquia que, somados, ultrapassam oito anos”, o que justificaria os oito anos de recomposição da vigência da patente.

Na decisão, o juiz diz ainda que “a demora excessiva do INPI em analisar pedidos de patente é fato público e notório, reconhecido inclusive pelo Tribunal de Contas da União (TCU)”.

A sentença tem como base um posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5529, em 2021. Na ocasião, a Corte declarou inconstitucional o parágrafo único do artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial (LPI), dispositivo que previa a prorrogação automática de patentes caso o INPI demorasse a analisá-las.

Apesar disso, o Supremo reconheceu, na mesma decisão, a possibilidade de ajustes pontuais no prazo de vigência das patentes (mecanismo conhecido internacionalmente como Patent Term Adjustment – PTA) em situações excepcionais de atraso não atribuível ao titular.

“A decisão do STF na ADI 5529, ao elogiar os sistemas de PTA, abriu caminho para que o Poder Judiciário, diante de casos concretos de atraso desproporcional e injustificado, supra a lacuna legislativa e determine o ajuste do prazo patentário, em conformidade com os princípios da isonomia e da efetividade da tutela jurisdicional”, afirmou o juiz na decisão.

Dessa forma, o magistrado determinou o ajuste do prazo de vigência da patente PI0410972-4 “em período correspondente à mora injustificada do INPI”, que ainda será definido por perícia técnica, mas que não deverá ser inferior aos oito anos já determinados pelo juiz.

Além de reconhecer o direito à recomposição do prazo da patente, a decisão determina que o INPI publique em até 15 dias, na Revista da Propriedade Industrial, a informação de que a vigência da patente encontra-se sob judice, além de inserir o mesmo aviso na página de andamento processual da patente em seu site. A sentença ainda impõe multa diária de R$ 1 mil em caso de descumprimento e condena o INPI ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios.

A Novo Nordisk afirmou, em nota, que a decisão “é um precedente relevante para a discussão sobre segurança jurídica e o ambiente de inovação no Brasil” e argumentou que a morosidade do INPI “consumiu a maior parte do período de proteção ao qual a empresa teria direito para recuperar os altos investimentos em pesquisa e desenvolvimento”.

“A decisão da Justiça Federal reconhece que a demora excessiva na análise de patentes não pode penalizar a inovação. O que buscamos é segurança jurídica para continuar investindo e trazendo ao Brasil os tratamentos mais modernos à população como um todo. Sem a garantia de que o direito à patente será respeitado e o exame ocorrerá em um prazo razoável, o Brasil corre o risco de ficar para trás no acesso a novas tecnologias em saúde”, afirmou, em nota, Ana Miriam Dias, diretora jurídica da Novo Nordisk no Brasil.

A companhia ressaltou ainda que o mesmo princípio defendido no caso da liraglutida se aplica ao pleito da companhia sobre a patente da semaglutida, princípio ativo de Ozempic, Rybelsus e Wegovy, que também esperou mais de 13 anos pela análise do INPI.

A farmacêutica esclareceu ainda que a patente PI0410972-4, objeto da decisão, protege um processo para a preparação de composições farmacêuticas estáveis, compreende um peptídeo semelhante a glucagon e um conservante farmaceuticamente aceitável. “Em outras palavras, é uma tecnologia para a ampliação da vida útil (prazo de validade) de produtos a base de liraglutida”. Assim, diz a empresa, o ajuste de prazo da patente afeta a exploração comercial de medicamentos a base de liraglutida, se estes forem produzidos usando o método descrito na patente da Novo Nordisk.

Inpi diz que demora se deve a acúmulo de processos

O INPI também foi procurado na noite desta quinta-feira para comentar a decisão, mas ainda não se pronunciou. O espaço está aberto e o texto será atualizado assim que o instituto enviar um posicionamento. No processo, o INPI argumentou que o atraso no processo foi causado pelo “acúmulo histórico de processos (backlog) na autarquia”.

O Estadão também procurou a EMS, laboratório farmacêutico produtor da primeira versão nacional da liraglutida, mas a empresa disse que não comentaria a decisão judicial.

Decisão pode dificultar acesso a produtos com preço mais acessível, diz médica

Para Maria Edna de Melo, coordenadora da Comissão de Advocacy da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso), independentemente da discussão jurídica, a extensão da patente desses medicamentos para obesidade podem atrasar ainda mais o acesso de mais pacientes a essas medicações, já que, com a exclusividade pertencente a um só fabricante, é menos provável que os preços dessas medicações sejam reduzidos.

“A gente sabe que, quando cai a patente, costuma haver uma diminuição de custo. Então, eu vejo essa decisão com preocupação e tristeza porque, independente do trâmite, do julgamento, do direito real ao usufruto, essa decisão distancia cada vez mais o paciente do tratamento que ele precisa”, afirma.

Fonte: Externa

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