Aos vinte e poucos anos, Soania Mathur sentia que estava no auge da vida. Tinha um casamento feliz, estava grávida da primeira filha e havia concluído recentemente sua residência em medicina familiar. Logo depois de começar a trabalhar em um consultório particular, ela notou um leve tremor no dedo mindinho da mão direita.
“No começo, era algo intermitente, mais um incômodo do que qualquer outra coisa”, diz Soania, hoje com 54 anos e moradora de Toronto. “Mas, à medida que minha gravidez avançava, o tremor também aumentava, tanto que ficou mais constante e preocupante”.
Seu marido, também médico, pediu que ela consultasse um neurologista. Após um exame clínico na principal clínica de distúrbios do movimento em Toronto, Soania foi diagnosticada com a doença de Parkinson, aos 27 anos de idade. Como não há cura, ela fez o possível para ignorar o tremor, que se agravou na mão direita, depois no pé direito e, por fim, no lado esquerdo do corpo na década seguinte.
Soania Mathur agora se dedica à educação dos pacientes, à escrita e à defesa das pessoas que sofrem com o Parkinson Foto: Reprodução/@unshakeable_md no Instagram
“Na época, eu tinha três filhas, um consultório movimentado, e os sintomas do meu Parkinson estavam ficando avassaladores e difíceis de controlar”, conta ela. “Meu médico naqueles tempos disse: ‘Você pode sair do consultório ou andando ou rastejando. Depende de você, mas algo tem que ser feito’”.
Pouco depois dessa consulta, Soania abriu mão de sua prática médica e agora dedica seu tempo à educação dos pacientes, à escrita e à defesa das pessoas que sofrem com o Parkinson.
O diagnóstico rápido de Soania não é a norma. A maioria dos pacientes mais jovens é diagnosticada erroneamente, o que gera atrasos no tratamento e no controle da doença. Eles também enfrentam desafios diferentes das pessoas que são diagnosticadas mais tarde na vida.
Soania e especialistas da área de saúde dizem que é necessária uma maior conscientização sobre a doença de Parkinson de início precoce, pois alguns estudos sugerem que sua incidência está aumentando, o que contraria a crença comum de que o aumento dos casos de Parkinson se deve ao envelhecimento da população.
Os pesquisadores também estão tentando entender por que algumas pessoas, como Soania, são diagnosticadas mais cedo na vida e se o Parkinson de início precoce é uma doença diferente do Parkinson de início tardio.
Desafios da doença de Parkinson de início precoce
O mal de Parkinson muitas vezes é visto como uma doença que afeta pessoas mais velhas, geralmente depois dos 60 anos. Mas de 5% a 10% dos pacientes desenvolvem os sintomas motores que são a marca registrada do Parkinson décadas antes.
As pessoas com doença de Parkinson de início precoce – definida por seu começo entre 21 e 50 anos – em geral são diagnosticadas erroneamente, o que leva a atrasos no tratamento e no gerenciamento adequados.
Um estudo constatou que os pacientes com menos de 45 anos tiveram uma latência muito maior entre o início da doença e o diagnóstico – mais de dois anos em comparação com nove meses para os pacientes com início tardio. Os pacientes mais jovens também precisaram de um número significativamente maior de consultas com o neurologista e exames clínicos para receber o diagnóstico correto.
“Os médicos não pensam na doença de Parkinson de início precoce, e mesmo os neurologistas com experiência em distúrbios do movimento às vezes não pensam nela”, analisa Bart Post, neurologista de distúrbios do movimento do Radboud University Medical Center, nos Países Baixos. “Muitos pacientes vão a um fisioterapeuta ou cirurgião ortopédico, fazem uma cirurgia no ombro, no quadril ou no joelho e, mais tarde, descobrem que era tudo Parkinson”.
Os pacientes mais jovens apresentam sintomas semelhantes aos dos mais velhos – tremor, lentidão de movimentos, rigidez nos membros – mas com algumas diferenças notáveis. A distonia, distúrbio de movimento caracterizado por contrações musculares sustentadas ou intermitentes, é observada com mais frequência na doença de Parkinson de início precoce, principalmente após exercícios. No entanto, a demência, os distúrbios do andar, os problemas gastrointestinais e a perda do olfato são menos frequentes, menos graves ou mais tardios em indivíduos mais jovens.
Talvez o mais intrigante seja o fato de a progressão da doença ser muito mais lenta em pacientes com início precoce.
A idade é provavelmente um dos fatores que explica essas diferenças clínicas marcantes, uma vez que os pacientes mais jovens têm uma saúde geral melhor. Mas as discrepâncias levaram à especulação de que o Parkinson de início precoce seja uma doença totalmente distinta.
“Em geral, dizemos aos nossos pacientes com doença de Parkinson de início tardio que eles continuarão funcionais – ou seja, não ficarão confinados a uma cadeira de rodas – por quinze anos”, comenta Raja Mehanna, professor associado de neurologia da McGovern Medical School da UTHealth Houston. “Mas, se você receber o diagnóstico aos 45 anos, não estará na cadeira de rodas aos 60. Estamos falando de mais duas ou três décadas de vida ativa”.
Soania, por exemplo, conseguiu continuar trabalhando como médica de família por 12 anos após seu diagnóstico, sem que colegas e pacientes percebessem. Devido ao estigma em torno da doença de Parkinson, ela a manteve em segredo de todos, exceto da família e dos amigos mais próximos, por medo de ser julgada como incompetente.
“Conheço muitas pessoas que foram demitidas depois de revelarem a doença no local de trabalho, ou que foram rotuladas como bêbadas ou drogadas por causa dos sintomas que apresentavam”, diz.
Suscetibilidade genética e exposições ambientais
Especialistas ainda estão estudando o motivo pelo qual algumas pessoas são diagnosticadas em idades tão jovens. A genética desempenha um papel importante: os pacientes de início precoce têm maior probabilidade de apresentar uma mutação associada à doença de Parkinson. Em comparação com os parentes de grupos de controle, os pais e irmãos de pacientes com início precoce têm uma probabilidade quase oito vezes maior de ter Parkinson. Ainda assim, cerca de 80% dos casos de início precoce – e 93% dos casos de início tardio – não têm causa conhecida.
Muitos especialistas suspeitam que a doença de Parkinson surja de uma interação entre a suscetibilidade genética e as exposições ambientais. Por exemplo, o tricloroetileno (TCE), produto químico muito usado para desengordurar metais, tem sido fortemente associado à doença de Parkinson e foi banido pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos em dezembro. Um estudo de 2021 em ratos mostrou que a exposição de ratos ao TCE induziu a ativação da LRRK2, enzima que, quando sofre mutação, é um fator de risco genético para a doença de Parkinson.
Uma possibilidade é que as pessoas que desenvolvem Parkinson de início precoce tenham uma predisposição genética que, após ser desencadeada por uma exposição ambiental, faz com que os sintomas se manifestem mais rápido. Em pacientes de início tardio, acredita-se que a doença comece até 20 anos antes dos primeiros sintomas motores.
“Digamos que eu tenha a mutação tipo A, que me faz desenvolver todos os sintomas em cinco anos, em comparação com a mutação tipo B, que demora vinte anos para se manifestar. Então, é Parkinson aos 45 anos contra Parkinson aos 60″, cita Mehanna. “Mas se essa mutação de início precoce é mais agressiva, por que a evolução da doença é mais lenta, e não mais rápida? Ainda estamos tentando entender tudo isso”.
Certas mudanças no estilo de vida podem reduzir o risco de Parkinson – em um estudo, a maior adesão à dieta MIND foi associada a um adiamento de até 17 anos no início da doença – mas são necessárias mais pesquisas, principalmente para a doença de início precoce.
“Definitivamente, algo que não enfatizamos o bastante é o quanto você pode fazer pelo seu cérebro só mudando a dieta. E há ótimos estudos que mostram que as pessoas que se exercitam na meia-idade podem reduzir o risco de Parkinson”, esclarece Rebecca Gilbert, diretora de missão da Associação Americana da Doença de Parkinson. “Não existe pílula mágica, e é algo que você precisa manter ao longo do tempo”.
Em defesa dos pacientes com Parkinson
Depois de se aposentar da medicina, Soania foi cofundadora da PD Avengers, uma organização global liderada por pacientes com a missão de acabar com a doença de Parkinson, em 2021. Seus sintomas pioraram, especialmente depois da menopausa, disse ela.
Mas suas três filhas lhe dão força, e seu casamento só se fortaleceu após o diagnóstico, comenta. Assumir o controle de sua saúde física e mental com dieta nutritiva e exercícios, consultas médicas frequentes e conexões sociais fortes a ajudaram a prosperar.
“Você precisa se manter ativo para viver bem com essa doença”, avalia Soania. “Não temos controle sobre o diagnóstico, mas podemos controlar como enfrentamos o diagnóstico”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU