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Silvio Santos prova que inovação é caos gerenciado | Guilherme Ravache

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Silvio Santos prova que inovação é caos gerenciado | Guilherme Ravache

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Mais que um hábil comunicador, Silvio Santos sempre foi um inovador apostando em novas tecnologias e modelos de negócio. Na juventude, implementou um sistema de alto falantes em uma barca do trajeto Rio-Niterói. Com música e publicidade, o negócio posteriormente evoluiu para um bar na barca para Paquetá, no qual quem comprasse um determinado número de bebidas, concorreria em um bingo.

Mas a iniciativa mais visionária de Silvio foi perceber que a TV era um veículo de massa, e principalmente, o mais eficiente meio de vendas. Foi nela que com oportunismo, e uma rara capacidade de entender o que o público queria, o empresário uniu seu tino para negócios com a nova tecnologia que entrava nos lares brasileiros.

Da reinvenção dos programas de auditório, com o Topa Tudo por Dinheiro com aviõezinhos com notas de dinheiro e câmeras escondidas, ao lançamento dos formatos de reality no Brasil, Silvio foi revolucionário. Pode-se argumentar que ele nem mesmo inventou estes formatos, mas foi decisivo ao moldá-los e popularizá-los no país.

Os mais jovens talvez imaginem que a Globo e o Big Brother Brasil sejam os pioneiros dos reality shows no Brasil, mas meses antes do BBB estrear, o SBT lançou de surpresa a Casa dos Artistas, confinando celebridades em uma casa vigiada por câmeras 24 horas por dia. A Casa dos Artistas foi um fenômeno de audiência.

Silvio conheceu o BBB em uma de suas temporadas nos Estados Unidos e inclusive chegou a negociar os direitos com os holandeses da Endemol, mas desistiu da negociação vencida pela Globo. Antes que a rival colocasse o BBB no ar, Silvio produziu a Casa dos Artistas em dois meses, sob sigilo, e colocou seu reality no ar de surpresa, sem qualquer divulgação prévia. Durante o período de pré-produção, Silvio também foi sequestrado e mantido refém por sete horas pelo criminoso que havia sequestrado sua filha, Patrícia.

A Casa dos Artistas foi um sucesso, mas a atração foi marcada pelo caos desde sua origem. O programa teve três temporadas, e tinha como uma de suas características a constante mudança de regras enquanto a atração ia ao ar. Alexandre Frota, um dos destaques da casa, chegou a desistir do programa, mas depois foi autorizado a retornar para o confinamento. Silvio também entrou na casa para informar os participantes de que havia mudado as regras e a votação deixaria de ser entre os participantes e passaria a ser feita por telefone pelos espectadores.

O reality pioneiro do SBT é um de muitos exemplos da genialidade caótica de Silvio Santos. A final da Casa dos Artistas foi a maior audiência já alcançada por um programa fora da Globo, um recorde que persiste há mais de duas décadas.

De certa forma, a Casa dos Artistas também revela as limitações do modelo de gestão do apresentador. Enquanto o BBB segue para a edição 25 batendo recordes de receita, a Casa dos Artistas parou em sua quarta edição após disputas legais pelos direitos do programa.

O fato é que nem todo o brilhantismo de Silvio foi suficiente para livrá-lo de erros estratégicos. Para muitos seu ponto fraco foi escolher alguns pupilos duvidosos. Meritocracia não foi o forte do apresentador, e afinidade era um fator determinante nas escolhas.

Após o PanAmericao quebrar com uma fraude fiscal bilionária cometida pelos executivos do próprio banco, Luiz Sebastião Sandoval, que trabalhou mais de 40 anos com Silvio Santos e esteve por 28 anos na presidência da holding que controlava as empresas do apresentador, afirmou não compreender a admiração de Silvio por Rafael Palladino, presidente do PanAmericano na época.

“Eu não conseguia entender essa admiração do Silvio por ele. O Palladino sempre foi um patife”, disse Sandoval à revista Piauí em 2001. Ainda segundo a publicação, quando soube do rombo, Silvio Santos fez uma única pergunta a Sandoval: “Eu fui roubado?” A resposta foi sim. Depois, na Polícia Federal, Silvio culpou seu ex-pupilo, Palladino, de tudo: “Ele era o cabeça do negócio.”

Funcionários como o ator Ivo Holanda, por exemplo, têm contrato vitalício com o SBT. Ou seja, Silvio se comprometeu a jamais demiti-los. “Eu sou vitalício no SBT, dou graças a esse homem, Silvio Santos. Eu tiro o chapéu pra ele e adoro esse homem”, disse Ivo Holanda em entrevista ao podcast Inteligência LTDA em 2022.

Mito ou realidade, alguns funcionários seriam intocáveis nas empresas de Silvio, o que gera desconforto entre aqueles que buscam uma organização mais ágil e eficiente para os tempos digitais.

O legado de Silvio Santos também é complexo no SBT e empresas do grupo. Por muitos anos ele tentou inserir as filhas nos negócios, mesmo tendo afirmado em diferentes ocasiões que elas não estariam qualificadas para sucedê-lo. Atualmente, Daniela Beyruti, a filha número 3, é quem dá as cartas no SBT. A executiva enfrentou resistência na alta cúpula e demitiu diversas lideranças, algumas trabalharam por décadas com Silvio. Todas as filhas do apresentador participam do Conselho do grupo ou estão ligadas a áreas artísticas do SBT.

Beyruti e as irmãs têm uma missão difícil. Além do declínio da mídia tradicional, ainda enfrentam desconfiança internamente no SBT. A emissora também tem encontrado dificuldades em renovar sua programação. Uma aposta em influenciadores digitais para novas atrações da casa não teria atingido a meta de publicidade e público. As irmãs descartam vender o SBT.

Nos tempos áureos do Google sob a liderança de Erich Schmidt, o CEO explicava que a gigante de buscas não dizia aos seus funcionários como inovar; ela gerencia o caos inventivo deles. O segredo? Misturar ideias fluídas com tomada de decisões disciplinada.

Sílvio era uma caldeirão de ideias e tomava todas as decisões, mesmo que mais por intuição do que propriamente disciplina. As constantes e repentinas mudanças na grade de programação eram um exemplo visível disso. Essa flexibilidade o tornou um comunicador e empresário formidável. Talvez com mais disciplina, como no caso do Google, tivesse evitado tropeços como o PanAmericano ou sua frustrada carreira política.

O problema da gestão de Silvio Santos é que este modelo deixou um legado difícil de ser replicado, porque gênios como ele são raros, muito raros.

Nada disso seria possível sem o carisma e uma impressionante habilidade de Silvio Santos para entender as pessoas e o que as move. Fosse vendendo Tele-Sena, a versão moderna do Baú, ou motivando seus funcionários, seu poder de entender os desejos das pessoas é lendário. Silvio foi tão eficiente no sentido de conhecer seus clientes e comunicar que tinha as soluções que eles estavam procurando, que o apresentador se tornou uma marca por si só.

Enquanto empresas contratam estudos para entender sua audiência, Silvio fazia suas pesquisas qualitativas todos os domingos ao passar o dia interagindo com seu público, ou as “colegas de trabalho”, como ele chamava as participantes do auditório.

Silvio não pode ser imitado, e reinventar seus negócios será o grande desafio de quem o suceder e quiser preservar seu legado.

Fonte: Externa

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