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Pentacampeão Edmílson quer revolucionar a formação de jogadores: ‘O sistema é pior que política’

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Pentacampeão Edmílson quer revolucionar a formação de jogadores: ‘O sistema é pior que política’

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Foto: Taba Benedicto/Estadão

Edmilsondirigente

Campeão do mundo com a seleção brasileira em 2002, Edmílson ainda respira o futebol praticamente todos os dias, mesmo aposentado da carreira de jogador há 13 anos. Em uma tarde de sexta-feira, no camarote do estádio municipal de Santana de Parnaíba, o ex-volante e zagueiro de São Paulo, Barcelona e Lyon vibra com um belo gol do atacante Lucas Silva, o Café, durante partida do Campeonato Paulista Sub-20 contra o Paulínia.

Café joga no Ska Brasil, time idealizado pelo pentacampeão e concebido no ano de 2019, em sociedade com o grupo japonês Skylight Inc. A vida esportiva do clube é de cerca de três anos, já que a pandemia de covid-19 veio pouco depois da criação. Apesar do período curto em atividade, o time profissional está a três jogos de subir da Série A4 para a Série A3 do Paulistão .

Neste sábado, joga a partida de volta das quartas de final contra o Grêmio Sãocarlense, após vencer a rodada de ida por 1 a 0. Se passar, precisa disputar as semifinais e chegar à final para ascender de divisão. Ao chegar à A3, estaria a dois acessos da elite estadual.

O objetivo principal da empreitada de Edmilson, contudo, é mais voltado a fortalecer a cultura das “fábricas de talento” no futebol. Ele quer, é claro, ver o time se destacando esportivamente, mas sua prioridade é a formação de atletas, meio que considera cheio de vícios e o qual espera transformar. Embora veja esta atuação como um negócio e seja transparente quanto à busca pelo lucro, entende que o mercado do futebol brasileiro é limitado a pequenos círculos.

“A nível de sistema, é pior que a política. Se você não entrar no sistema, na venda, na ponta, você não vai negociar”, diz ao Estadão. “A gente não tem exclusividade de representação, como têm muitos clubes de formação. ‘Você só entra se fechar o agenciamento com aquele cara ali’. Isso acontece. Aqui, os agentes são abertos para trazer os atletas”, completa.

Presidente do Ska Brasil, Edmílson tem como foco de trabalho a formação de jogadores. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Os desafios para se manter como um clube formador vão da logística aos custos. O Ska Brasil tem um enorme e bem equipado CT em Santana de Parnaíba e dispõe do novíssimo estádio Estádio Municipal Prefeito Gabriel Marques da Silva para mandar seus jogos, mas os gastos são constantes.

“A nível de sistema, é pior que a política. Se você não entrar no sistema, na venda, na ponta, você não vai negociar”

Edmílson, sobre trabalhar com formação e venda de jogadores

Em um jogo como mandante no Paulista Sub-20, por exemplo, o custo de operação está na casa dos R$ 7 mil, valor com o qual Edmílson consegue arcar, mas vê outros clubes do tipo com dificuldades para bancar. “Como um clube vai formar, em um país-continente, jogadores bons cognitivamente, fisicamente, sabendo que não consegue pagar nem a operação de jogo?”.

Além disso, o clube se compromete a fornecer alimentação, educação e serviços de saúde aos jogadores, fora os salários. No time que disputa a Série A4, formado majoritariamente por jogadores sub-23, conforme manda o regulamento, os jovens atletas ganham entre R$ 2 mil e pouco mais de R$ 3 mil .

Estratégia já deu retorno financeiro ao Ska Brasil

Apesar das dificuldades apontadas por Edmílson, o Ska já conseguiu ter lucro em seus poucos anos de existência, situação que o pentacampeão atribui à inteligência na hora de fechar bons contratos. “Este ano a gente tem a perspectiva de executar a compra de alguns atletas que a gente negociou lá em 2021, 2022. A gente tem uma receita entre R$ 2,8 e R$ 3 milhões de jogadores que a gente negociou”, explica.

O clube negociou recentemente um de seus talentos, o atacante Ryan Gustavo, de 17 anos, com o São Paulo e manteve parte dos direitos econômicos. O garoto chegou a jogar na base do Palmeiras, mas foi dispensado após três anos e recomeçou no Ska Brasil. Pelo time de Edmílson, chegou à final do Paulista Sub-17, na qual foi derrotado pelo Palmeiras de Luís Guilherme, hoje profissional no alviverde.

Mesmo perdendo, Ryan chamou a atenção do São Paulo, clube que apresentou ao Brasil o volante Edmílson, revelado pelo XV de Jaú na década de 1990. Na equipe tricolor, o garoto de 17 anos impressionou em 2023, pois terminou a temporada com 42 gols em 34 jogos. Um caso como esse, contudo, não se repete sempre. São recorrentes situações em que times maiores conseguem tirar jogadores de clubes formadores sem dar nenhum retorno financeiro.

“O clube grande vem aqui e fala assim: quero ele de vitrine, quero ele emprestado. Va, usa e não devolve nada para o clube”, explica o ex-jogador. “Eu tive que pagar professor, alimentação, moradia, tudo. O cara vem, pega o jogador, leva para lá, enche a cabeça do cara. Acha que vai jogar no São Paulo, mas vai ter de passar num funil bem estreito. Se não der certo, o São Paulo libera e eu fico chupando dedo. E gastei R$ 3 mil reais com um atleta desse.”, exemplifica.

De qualquer forma, o Ska tem jogadores formados em suas dependências espalhados pelo Brasil. É o caso do meia Felipe Bryan, negociado com o Flamengo, e do lateral-direito Dija, vendido ao Red Bull Bragantino.

Time sub-20 do Ska Brasil celebra gol contra o Paulínia. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Metodologia e mercado internacional

Ao elaborar o conceito do clube que seria criado em 2019, Edmílson pensou em uma metodologia que usasse referências internacionais, mas que fosse inerentemente brasileira. Assim, sob o lema “criatividade, improviso e enfrentamento”, estabeleceu no Ska o mesmo sistema de treinamentos desde a categoria para crianças até o profissional.

“Eu contratei uma empresa espanhola, e ficava três horas por dia com eles passando minhas ideias sobre o que é o futebol brasileiro. Não adianta nada eu querer implementar o método alemão, espanhol, italiano, dentro do Brasil. Dentro da metodologia, você tem um modelo de jogo. Dentro do modelo de jogo, seja 4-3-3, 3-4-3, 3-5-2, você tem um perfil de cada posição”, diz.

O pentacampeão também já levou os garotos do sub-20 do time de Santana de Parnaíba para a Europa, onde busca abrir o mercado. A equipe jogou um torneio na região da Costa Brava, na Espanha, e só perdeu a final nos pênaltis, para o Barcelona. Também foram realizados amistosos com Villarreal e Zaragoza, os outros dois times nos quais Edmílson atuou no futebol espanhol. “A gente fez 11 jogos, sete vitórias e quatro empates. Levamos o Ska para lá, conectamos alguns agentes e olheiros de clubes espanhóis, italianos e franceses com os nossos atletas”.

O caminho inverso da ponte internacional também ocorre.. O Ska Brasil traz garotos de fora para treinar no clube, seja profissionalmente ou como uma experiência de férias. Muitos desses jovens são japoneses. É o caso de Shoma, jovem meia de 20 anos que chegou ao time em 2022 e hoje é um dos destaques da fase final da Série A4 do Paulistão.

‘Nosso objetivo é ser uma fábrica’

Edmílson defende que o Brasil tem mais dificuldades de revelar talentos absolutos atualmente por causa da forma como o mercado opera, sem oferecer proteção a clube menores. Outro ponto que o ex-volante faz questão de colocar em discussão é a forma como pais de jovens atletas depositam toda a esperança de salvação financeira da família sobre eles.

“Por isso, eu acho que o futebol brasileiro está carente de grandes talentos. Tem o Endrick, tem o Estêvão? Tem, mas na década de1990, início dos anos 2000, quem era o fornecedor, antes da Lei Bosman, da Lei Pelé, eram os pequenos. Eu mesmo sai do XV de Jaú e o São Paulo comprou meu passe”, diz.

“O que está acontecendo com o Endrick é fenomenal, mas quantos pais estão vendo a história e pressionando filhos com 10, 12 anos. Isso é horrível para o futebol, porque o pai pobre vai ver o filho como uma mina de ouro. O menino está de forma natural honrando o que o pai fez, vivendo o lado familiar, mas quantos milhares de pais estão aí… Minha mensagem é que os clubes, federação e o sistema do futebol olhem para os formadores. Os jogadores que começaram com a gente com 13, 14, 15 e 16, às vezes não têm oportunidade no time grande porque lá tem um sistema, burocracia”, completa.

A expectativa do pentacampeão é de ver o Ska vencer o Grêmio Sãocarlense neste sábado, a partir das 16 horas. Depois disso, espera passar pela semifinal, conseguir o acesso e buscar o título, mas não vê uma potencial ascensão de divisão mudando a natureza de seu empreendimento.

“A gente quer seguir sendo um clube formador, que forneça atletas para os clube. Olhar esses times que são realmente pequenas fábricas, que possam ser fornecedores. Que os clubes olhem para cá não como adversários, nunca a gente vai chegar na história de 100 anos de qualquer time grande do Brasil, dificilmente. E não é o nosso objetivo. Nosso objetivo é ser fábrica, ser uma fazenda com pequenos bois e esses bois serem vendidos”.

Fonte: Externa

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