Uma pesquisa sobre as perdas de aprendizagem associadas a problemas de visão revela que, no Brasil, o acesso a óculos na infância poderia aumentar em até R$ 296,5 mil os ganhos ao longo da vida adulta.
Realizado pela Agência Internacional para a Prevenção da Cegueira (IAPB) e a Fundação Seva, o estudo considera os dados do Global Burden of Disease (GBD) — que estima cerca de 800 mil crianças brasileiras vivendo com problemas oftalmológicos não corrigidos, como miopia e hipermetropia — e uma pesquisa anterior, realizada na China, que mostra o quanto os pequenos com óculos pontuam mais em testes de matemática, ciências e chinês do que aqueles que não enxergam direito.
“No geral, a pesquisa indica que o resultado obtido por crianças sem óculos é metade daquele registrado por crianças com boa visão, o que significa que elas aprendem metade do que seus colegas”, diz Peter Holland, diretor executivo da IAPB no Reino Unido.
O impacto da ausência de óculos foi convertido em anos de escolaridade perdidos, ou seja, tempo em que o aprendizado ficou abaixo do esperado. Em seguida, o grupo relacionou os dados de escolaridade à expectativa de renda, considerando para cada ano de aprendizado completo um incremento de 10% nos rendimentos futuros.
A conclusão: se uma criança brasileira de 5 anos recebe os óculos no início da vida escolar e continua usando o acessório até os 18 anos, ela terá ao longo da vida uma renda, em média, 78,1% maior do que se nunca tivesse corrigido a visão e melhorado o aprendizado.
“Essa diminuição do aprendizado não afeta apenas as famílias individualmente”, diz Holland, “mas também tem um enorme efeito cumulativo nas economias”. Para ele, apontar a dimensão do problema é uma forma de angariar esforços para corrigir a falta de acesso a óculos no País.
Desafios no Brasil
Entre os desafios para o diagnóstico de problemas oftalmológicos e a prescrição de óculos no Brasil, os pesquisadores listam fatores como o acesso aos cuidados oculares e a atenção ao tema no sistema educacional como um todo. “Em regiões com acesso limitado a serviços de saúde, garantir a adesão e o uso consistente dos óculos pode ser mais desafiador”, afirma Holland.
Além disso, há uma lacuna mesmo antes de a criança atingir a idade escolar: nem todos os recém-nascidos realizam o o teste do reflexo vermelho (TRV) ou “teste do olhinho” na maternidade e nem todos os bebês passam pelo exame oftalmológico entre os primeiros seis meses e um ano de vida, como preconiza a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), para a detecção precoce de problemas oculares.
No ano passado, pesquisadores reunidos no I Fórum da Câmara Técnica de Oftalmologia do Conselho Federal de Medicina (CFM) lançaram uma “carta pela saúde ocular das crianças brasileiras”. Entre as demandas, o grupo defendeu ampliação da rede de assistência oftalmológica na atenção básica e a garantia de realização do TRV nas maternidades.