Como esse texto precisa começar de algum lugar, que tal uma imagem fantasiosa? A suposição: o Brasil tem partida de estreia em Copa do Mundo, jogando em casa. Por coincidência, o sequestro do ônibus 174, aquele que virou documentário e deu o que falar, começa a ser transmitido ao vivo pela TV – e não para mais, magnético e adequado ao interesse de todos pelo sensacionalismo imediato. A Copa sai do ar, pá-pum.
É difícil imaginar qual seria a reação de quem segue e gosta de futebol, mas há algumas possibilidades: uma guerra civil, multidões quebrando as sedes das emissoras… Quem sabe brasileiros com camisas amarelas p…. da vida pelas ruas, não para dar um golpe, mas para exigir seus direitos inalienáveis. Como assim cortar a transmissão de uma Copa? Seria o fim dos tempos, o apocalipse no país do futebol – e, bem, amigos do Brasil, não haveria Galvão Bueno para narrá-lo.
Improvável e impossível, a não ser no terreno da ficção. Daria um filme de terror e suspense, um daqueles de catástrofe, terremotos, enchentes, incêndios. Pois, então, foi o que aconteceu, sem tirar nem pôr, naquele 17 de junho de 1994, uma sexta-feira, nos Estados Unidos.
Em Chicago, Alemanha e Bolívia faziam o jogo inaugural da Copa, 16h e calor de rachar. As emissoras de TV começavam a soltar pequenas entradas ao vivo em torno de O.J. Simpson, acusado de matar a ex-companheira. Os repórteres entravam em cena, cortando os lances do jogo, sem nenhum pudor dos diretores de imagem.
Quando Espanha e Coreia do Sul puseram os pés no gramado, às 18h, em Dallas, as notícias sobre o ex-jogador de futebol americano aumentavam em frequência. E então começou a cobertura da fuga dentro de um Ford Bronco pelas estradas da Califórnia. A Copa do Mundo dos Estados Unidos, ao menos para os telespectadores americanos, saiu do ar para nunca mais. O corre espetacular de Simpson atrairia mais de 96 milhões de pessoas.
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A decisão correta
Futebol? Copa? Adeus, adeus, era difícil saber quem transmitiria, e se transmitiria. Aqui daria sangue. Lá não deu em nada – e o sujeito da bola oval que teria cometido um crime venceu de goleada a turma da bola redonda. Era O.J. – e mais ninguém. Nós, jornalistas brasileiros que acompanhávamos a seleção, logo vimos, nos dias seguintes, o que significava o torneio de futebol nas terras de lá. Era um fiapo.
Em um restaurante, logo depois da partida entre Brasil e Suécia, em Detroit, empate em 1 a 1, na primeira fase, dois jovens americanos se aproximaram da mesa de brasileiros em algazarra. A dupla estava curiosa.
– Por que vocês estão tão animados?, perguntou um deles.
– Deve ser algo muito legal, completou o outro.
Um dos torcedores de verde-e-amarelo, no inglês possível, deu a informação:
– Copa do Mundo, Copa do Mundo de Futebol.
– O quê? Aqui nos Estados Unidos, não estava nem sabendo? E qual foi o jogo que vocês viram?
– Brasil e Suécia.
– Que legal, e quem ganhou?, indagou o americano.
– Empate de 1 a 1.
– Como assim, o jogo terminou e ninguém saiu ganhando? Pode isso?
Pois é, o pessoal da televisão estava certo ao interromper as imagens dos estádios para levar às telas O.J. Simpson no carrão, naquela corrida maluca de mais de quatro horas — e o resto é história. A concorrência era desleal. Como assim um jogo não ter vencedor?
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