O passado é realmente uma assombração em matéria tributária no Brasil. Começamos a nos preparar para uma reforma tributária que será implementada de maneira gradual pelos próximos 10 anos e, ao mesmo tempo, vemos na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) um tema da “reforma tributária” levada a cabo em meados da década de 1990.
Para relembrar as leitoras e os leitores mais antigos (ou experientes) e para informar as leitoras e os leitores mais jovens, a Lei n° 8.981, de 20 de janeiro de 1995, estabeleceu, em seu artigo 42, que “a partir de 1º de janeiro de 1995, para efeito de determinar o lucro real, o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas ou autorizadas pela legislação do Imposto de Renda, poderá ser reduzido em, no máximo, trinta por cento”. Esse dispositivo ficou conhecido com a trava dos 30%.
Essa assunto já foi apreciado pelo STF e foi reconhecida a sua constitucionalidade. O objeto do julgamento agora é a respeito da aplicação da trava dos 30% no caso de pessoa jurídica extinta, uma vez que o saldo de prejuízo fiscal restaria perdido.
Já tratei deste assunto aqui há praticamente um ano, apresentando argumentação transdisciplinar para a inconstitucionalidade dessa limitação na compensação de prejuízo fiscal. Neste momento, entretanto, convém reforçar esse entendimento considerando a extinção da pessoa jurídica.
De maneira bastante sumária, na legislação societária-contábil, a absorção de prejuízos (contábeis, não fiscais) é mandatoriamente a primeira destinação dos lucros (artigo 189 da Lei n° 6.404, de 1976). Esse dispositivo legal tem como motivação o postulado contábil da continuidade, que significa que os saldos constantes no balanço patrimonial devem considerar o histórico passado (desde a constituição da empresa) e o histórico futuro (perspectiva de perpetuidade, ou não, da empresa). Nesse sentido, havendo saldo de prejuízo contábil (não fiscal) gerado em períodos anteriores, o lucro gerado não poderá ser distribuído aos sócios antes da obrigatória compensação desse prejuízo, sob pena de se estar devolvendo capital social.
Teoricamente, o mesmo raciocínio deveria ser aplicado à compensação do lucro real com o saldo de prejuízos fiscais: a trava dos 30% implica tributação do patrimônio da empresa (capital social) e não do lucro (renda). No entanto, entendeu o STF que a compensação de prejuízo fiscal seria uma “benefícios” concedido pela lei tributária, motivo pelo qual poderia ser limitada.
Agora, na perspectiva do fim da continuidade da empresa, isto é, no caso da sua extinção, a tributação do patrimônio causada por essa limitação legal é evidente.
Considerando as informações financeiras, a existência de saldo de prejuízo contábil (não fiscal) no momento da extinção da sua extinção, demonstra que a empresa possui mais dívidas do que ativos, o que implica a inexistência de lucro (renda). Não havendo lucro, os sócios nada receberão como acréscimo ao capital social – na verdade, a tendência é que os sócios não consigam sequer a devolução do capital investido. Se assim é, não haveria, da mesma forma, lucro a ser tributado.
Obviamente, pela limitação do espaço, aqui foram apresentadas as linhas gerais do argumento pela inconstitucionalidade da trava dos 30% na extinção da empresa. De qualquer maneira, espera-se que os senhores ministros do STF estejam atentos às motivações e aos efeitos dos seus votos nesta matéria.