Pequenas, silenciosas e numerosas, as formigas geralmente são vistas como inofensivas, mas podem representar riscos à saúde. Ao invadir ambientes domésticos, esses insetos podem desencadear reações alérgicas em pessoas com predisposição genética e ainda carregar micro-organismos capazes de causar infecções.
Odair Correa Bueno, professor do departamento de biologia geral e aplicada do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro, destaca que as formigas costumam ir para ambientes residenciais porque são locais sossegados, com oferta de alimento e espaços propícios para construir seus ninhos. Quando dominam um ambiente, esses bichos minúsculos formam grandes colônias rapidamente.
Formigas tendem a formar colônias numerosas rapidamente, e não são tão inofensivas como muita gente pensa. Foto: Víctor/Adobe Stock
A presença constante e excessiva aumenta a probabilidade de contato com os seres humanos e, consequentemente, o risco de reações alérgicas em pessoas sensíveis. “O indivíduo que é alérgico tem uma predisposição genética. A gente sempre brinca que não é alérgico quem quer, mas quem pode. Então, nem todo mundo vai apresentar reações”, contextualiza Fátima Rodrigues Fernandes, presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).
“Algumas espécies de formigas têm um tipo de veneno que pode ser inoculado durante a picada no ser humano. Tanto a saliva quanto a picada são capazes de causar uma reação, que pode acontecer só no local da picada ou se estender para outros órgãos, a chamada reação anafilática. Ela acomete dois ou mais órgãos, geralmente a pele e mais algum sistema, como o respiratório”, descreve.
Os sintomas variam de acordo com a parte do corpo afetada. Quando o sistema respiratório é comprometido, por exemplo, é comum que o paciente apresente falta de ar, tosse e chiado no peito. Já nas infecções que atingem o sistema cardiovascular, podem ocorrer queda de pressão, desmaios e episódios de hipotonia (com diminuição de força e resistência dos músculos).
Coceira e vermelhidão são reações comuns após a picada de uma formiga, mas, em pessoas alérgicas, os efeitos tendem a ser muito mais intensos. Nessas situações, pode ocorrer dor forte no local da picada, além de queimação, inchaço e coceira persistente. Em casos mais graves, há o risco de esses sintomas se espalharem para outras partes do corpo, formando placas de urticária, fora a probabilidade de reação anafilática.
“Essas reações são mais graves, elas colocam em risco a vida daquele indivíduo. Então, frente a uma suspeita de alergia a formigas, a gente tem que fazer uma investigação muito cuidadosa para instituir um tratamento adequado”, frisa Fátima. “É bom destacar que, principalmente, a formiga ‘fire ant’, a formiga de fogo, injeta veneno, aumentando o risco de reações graves”.
Uma das principais preocupações no Brasil é garantir o acesso rápido à adrenalina — também conhecida como epinefrina —, medicamento essencial para o tratamento imediato de reações alérgicas graves. Elas são canetas injetáveis que devem ser aplicadas logo após a picada. “Essas canetas ainda não são comercializadas no País, o que é uma grande lacuna para os pacientes”, alerta a presidente da Asbai.
Formigas podem transportar micro-organismos
É comum ouvir que comer formiga é receita para melhorar a visão. A crença popular, no entanto, não tem comprovação científica e, na verdade, pode expor os indivíduos ao risco de contrair alguma doença infecciosa. “As formigas acabam sendo veículos para micro-organismo, como as bactérias, se transportarem de um ambiente para o outro”, destaca Bueno.
“As formigas não causam doenças infecciosas por si só, mas podem ser vetores”, resume. “Devido ao seu tamanho, esses insetos podem entrar em praticamente todos os locais. É diferente de uma barata, que não consegue passar por uma malha fina, por exemplo”.
Fátima cita a possibilidade de ocorrerem infecções virais autolimitadas, como gastroenterites, quadros de diarreia, vômito etc.
A transmissão, no entanto, é uma coisa rara e relativamente difícil de acontecer. “Se as formigas transmitissem doenças (facilmente) só pelo açúcar do café, metade do Brasil já estaria doente. Não é uma coisa tão simples”, pontua João Justi Júnior, pesquisador e biólogo do Instituto Biológico de São Paulo.
“Mas, já que existe a possibilidade, é recomendado controlar as formigas dentro de casa”, diz.
Como controlar as formigas?
De acordo com Justi, é muito difícil evitar que formigas apareçam em casa, não importa se a pessoa mora no térreo ou no vigésimo andar. Mas é possível controlar sua presença.
As formigas, de acordo com ele, precisam de “quatro A’s para infestar um lugar: acesso, abrigo, alimento e água. “Se a pessoa conseguir tirar uma dessas quatro coisas, as formigas não vão conseguir se instalar”, afirma. “Mas isso é algo meio utópico. Que casa não tem água na pia ou no chuveiro, que não tem uma migalha no chão?”, questiona.
Bueno frisa que uma medida totalmente contraindicada é jogar spray inseticida nos insetos. “As formigas que são atingidas vão morrer, sem dúvida. Mas grande parte vai fugir e se espalhar pelo resto da casa. Então, você não está controlando, está mandando a formiga de um lugar para outro”.
O recomendado é usar iscas. “É possível encontrar em qualquer mercado uma isca em forma de seringa plástica com um gel atrativo para as formigas. Elas identificam o produto como alimento e o levam para dentro do ninho. Esse gel contém um princípio ativo de baixa toxicidade, seguro mesmo em caso de ingestão por pets ou crianças”, ensina Justi.