Sou especialista no tratamento de idosos com câncer. Por isso, tive o privilégio de ajudar pessoas em momentos cruciais da vida. Testemunhei triunfos do espírito humano e lições comoventes sobre como viver uma vida que tenha sentido.
Também tentei ser um bom aluno e anotar as coisas que meus pacientes diziam. Eles são os melhores professores que um médico poderia imaginar. Aqui estão as lições que eles me ensinaram.
1. Trabalhe para realizar seus sonhos agora
Vejo isso todos os dias: meus pacientes trabalham a vida toda, economizam para a aposentadoria e anseiam pela melhor idade, quando poderão passar mais tempo com a família e fazer o que mais gostam. Mas, logo depois de aposentar, eles são diagnosticados com câncer.
A idade média de um diagnóstico de câncer nos Estados Unidos é 66 anos, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer. É quase exatamente a idade legal de aposentadoria no País, entre 66 e 67 anos.
Então, não deixe para depois as atividades ou experiências que lhe trazem prazer, presumindo que terá a oportunidade de fazê-las depois da aposentaria. Reserve um tempo para a família, para viajar e para criar memórias especiais agora mesmo. É isso que meus colegas oncologistas e eu fazemos.
Para oncologista, não devemos postergar atividades ou experiências que trazem prazer Foto: sanechka/Adobe Stock
2. Reflita sobre seu relacionamento
No começo da carreira de oncologista, comecei a anotar informações sobre pacientes que estavam casados havia mais de 40 anos. Ao longo de dois anos, registrei suas respostas à pergunta: Qual é o segredo para um casamento duradouro?
Muitos disseram que é preciso ter senso de humor ou que dá muito trabalho.
Alguns se recusaram a responder, preferindo discutir a logística do tratamento do câncer.
Outros responderam com brutal honestidade, dizendo, por exemplo, que “não conseguiram encontrar ninguém melhor e tiveram que se contentar”.
Havia também aqueles que tinham uma reação mais afetuosa. Olhavam calorosamente para seus parceiros, que por sua vez retribuíam o olhar. Muitas vezes, davam as mãos. Aí alguém dizia: “Não sei. Nós simplesmente nos amamos”.
Este é o tipo de relacionamento que todos devemos almejar.
Pergunte-se o que você diria. E se seu parceiro ou parceira estaria ao seu lado em momentos tão difíceis. A resposta pode ter impacto na sua saúde.
Um estudo publicado no periódico Cancer constatou que divórcios ou separações ocorreram entre pacientes com câncer na mesma proporção que na população em geral. Mas, para as mulheres, o risco foi seis vezes maior. E aquelas que se separaram ou se divorciaram durante a doença tiveram maior probabilidade de ter menos qualidade de tratamento e de vida.
3. Pergunte-se: o que é mais importante?
Parte da minha conversa inicial com os pacientes passa por perguntar sobre seus objetivos: para o tratamento do câncer e para a vida. Alguns pacientes não querem terapia, preferindo passar o máximo de tempo possível em casa com a família. Outros me dizem que querem tratamento para maximizar suas chances de viver o suficiente para chegar a um evento importante da vida, como o 50º aniversário de casamento ou o nascimento de um neto.
Um homem, diagnosticado com dois tipos agressivos de câncer, havia criado a neta e queria viver até o casamento dela, para levá-la ao altar. Nós o tratamos de leucemia e, depois, de câncer de pulmão para que ele chegasse ao grande dia. Ainda guardo a foto dele de smoking, meio apoiado na neta, vestida de branco, os dois sorrindo ao passar por familiares e amigos nos bancos da igreja.
Enquanto você estiver saudável, reserve um momento para considerar o que é significativo para você e o que você precisa fazer para atingir esse objetivo.
4. Evite hábitos que possam causar câncer
Minha família tem histórico de câncer, então, desde a faculdade, tomei medidas para mitigar meu risco. Limito meu consumo de álcool. Evito bebidas açucaradas, fast food e alimentos ultraprocessados. E pratico exercícios diariamente.
Já ouvi pessoas se referirem a esses hábitos como “vida chata”. Mas, quando encontro meus pacientes logo após um diagnóstico de câncer, quase todos perguntam se houve algo no estilo de vida que possa ter causado a doença.
Um estudo da Sociedade Americana do Câncer publicado em 2024 estimou que 40% dos novos diagnósticos de câncer em adultos com mais de 30 anos nos Estados Unidos tinham a ver com fatores de risco modificáveis. Quando o câncer pode ser associado a questões de estilo de vida, meus pacientes geralmente expressam profundo arrependimento.
Embora não seja garantido que fumar e beber causem câncer, sua associação com o risco é clara. Qualquer prazer que eu possa obter desses hábitos é superado pelo meu medo de ter câncer.
5. Mesmo em tempos difíceis, seja gentil
Você talvez pense que pacientes em meio a uma crise de saúde não se importam com o meu bem-estar como médico. Mas, muitas vezes, vou ao consultório para conversar com pacientes com câncer, questioná-los sobre os efeitos colaterais do tratamento, falar de seu bem-estar geral e fazer exames físicos. Quando termino, há uma pausa na conversa, e aí alguns deles perguntam:
“Mas e você, doutor, como você está? Como está sua família? Está tirando um tempo para si mesmo?”
Às vezes, rimos da mudança repentina na dinâmica. Mas também é verdade que ser gentil pode ser bom para você: a gentileza tem sido associada à melhora da conexão social, à satisfação, à redução da depressão e da ansiedade e ao bem-estar.
Sempre me sinto grato e profundamente comovido quando alguém que está lidando com um diagnóstico tão grave reserva um tempo para se concentrar nas pessoas ao seu redor.
Dr. Mikkael A. Sekeres é chefe da divisão de hematologia e professor de medicina no Sylvester Comprehensive Cancer Center da Universidade de Miami. Ele é autor dos livros When Blood Breaks Down: Life Lessons from Leukemia e Drugs and the FDA: Safety, Efficacy, and the Public’s Trust. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU