A edição de 2025 do Congresso da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO), realizado em Chicago, trouxe novos dados sobre um dos tratamentos mais revolucionários da medicina atual: a terapia celular CAR-T. Originalmente desenvolvida para alguns tipos de câncer do sangue, como leucemias, linfomas e mieloma múltiplo, essa estratégia pode estar prestes a ganhar espaço no tratamento de tumores sólidos. Este é um desafio que há anos mobiliza a comunidade científica.
A tecnologia CAR-T cell consiste em reprogramar os linfócitos T, ou seja, as células de defesa do próprio paciente, para que reconheçam e destruam as células tumorais. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já aprovou o uso da terapia em pacientes com alguns cânceres hematológicos que não responderam a outras linhas de tratamento. E os resultados são impressionantes: muitos desses pacientes conseguiram respostas completas, com controle duradouro da doença — em alguns casos, com potencial de cura.
O grande obstáculo, até agora, era levar esse sucesso para os tumores sólidos, como câncer de mama, pulmão, fígado ou intestino. Esses tumores têm características biológicas diferentes e, principalmente, faltam alvos moleculares específicos que permitam às células CAR-T identificar o que precisa ser combatido.
Mas os dados apresentados na reunião da ASCO deste ano reacenderam a esperança de mudar esse cenário.
Tratamento inovador pode impactar o tratamento de mais tipos de tumores Foto: freshidea/Adobe Stock
Um novo alvo no câncer gástrico
Entre os destaques do congresso, o mais importante do mundo na área de oncologia, está um estudo que avaliou o uso de CAR-Ts contra um alvo chamado claudina 18.2, uma proteína hiperexpressa em alguns subtipos de câncer de estômago. A nova geração de CAR-Ts foi desenvolvida para reconhecer essa proteína e atacá-la de forma seletiva.
Mesmo em pacientes que já haviam esgotado múltiplas linhas de tratamento, os resultados foram surpreendentes: altas taxas de resposta e, mais importante, respostas duradouras, indicando um potencial real de controle da doença a longo prazo.
Embora ainda seja cedo para falar em cura nesse contexto, os dados indicam que as CAR-Ts podem, sim, ter um papel relevante em tumores sólidos — desde que se identifique o alvo certo.
Aplicação inédita em tumores cerebrais
Outro estudo que chamou a atenção foi conduzido por pesquisadores da Universidade Harvard, com uma proposta ousada: avaliar a terapia CAR-T em tumores cerebrais malignos, notoriamente agressivos e de difícil tratamento. A pesquisa envolveu dez pacientes em estado avançado da doença, todos já sem alternativas terapêuticas eficazes.
A estratégia foi desenvolver uma terapia que identificasse uma alteração específica das células tumorais cerebrais, sem atacar células saudáveis do cérebro. Os resultados preliminares mostraram respostas imunológicas significativas, o que representa um avanço importante em um dos tipos de câncer mais desafiadores da medicina.
Esses estudos mostram que, embora a terapia CAR-T ainda esteja em fase de desenvolvimento para tumores sólidos, o horizonte está se expandindo. A chave para o sucesso parece estar na identificação de alvos altamente específicos, que permitam que as células T modificadas ataquem apenas o tumor, poupando os tecidos saudáveis.
Além disso, novas abordagens complementares à CAR-T vêm sendo desenvolvidas, como anticorpos biespecíficos, anticorpos conjugados a drogas e vacinas contra o câncer. Todas essas estratégias buscam o mesmo objetivo: controlar melhor a doença, reduzir seus impactos e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
A oncologia vive um momento de virada. O que até poucos anos atrás era considerado impossível começa a ganhar forma. Se ainda não é a cura para todos, a terapia celular representa a promessa concreta de um novo capítulo no combate ao câncer — com tratamentos mais personalizados, eficazes e esperançosos.