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Câncer de pulmão cresce entre mulheres e não fumantes e acende alerta entre cientistas

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Câncer de pulmão cresce entre mulheres e não fumantes e acende alerta entre cientistas

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Embora o cigarro ainda seja a causa de cerca de 80% dos casos de câncer de pulmão, e o tumor continue sendo mais prevalente em homens, cientistas têm observado nos últimos anos uma “nova face” da doença: mais diagnósticos entre mulheres e não fumantes.

O cenário tem motivado estudos nacionais e internacionais que buscam entender os fatores por trás dessas tendências. De acordo com dados do portal Datasus, do Ministério da Saúde, a proporção de vítimas femininas do câncer de pulmão vem aumentando consistentemente nos últimos 20 anos. Em 2003, do total de mortos por esse tipo de tumor no País, 32% eram mulheres. Em 2023, esse índice passou para 46%.

Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca) e especialistas ouvidos pelo Estadão, o aumento da doença entre mulheres ainda parece ter relação direta ou indireta com o tabagismo.

“Historicamente, as mulheres começaram a fumar depois dos homens. Mas, a partir principalmente da segunda metade do século 20, houve um incremento no número de mulheres fumantes. Essa tendência de crescimento do tabagismo feminino trouxe uma nova preocupação para a saúde pública”, diz Marcela Roiz, chefe substituta da Divisão de Controle do Tabagismo e Outros Fatores de Risco (Ditab) do Inca.

A pesquisa Vigitel, realizada pelo Ministério da Saúde, confirma que, apesar de os homens fumarem mais do que as mulheres, a queda no índice de fumantes no País é muito mais acentuada entre eles. De 2006 a 2023, o índice de tabagistas do sexo masculino caiu de 19,5% para 11,7% no Brasil, enquanto o de mulheres tabagistas passou de 12,4% para 7,2%.

Como o câncer de pulmão aparece geralmente após décadas de exposição ao cigarro, o resultado estaria sendo sentido só agora.

Outra hipótese investigada para o aumento de casos entre mulheres, inclusive não fumantes, é uma diferença entre os sexos na forma de metabolizar substâncias tóxicas para o organismo.

“O tabagismo de segunda mão (fumo passivo) é mais maléfico para as mulheres porque estudos mostram que elas parecem ter menor capacidade de reparar os danos feitos ao DNA por essas substâncias. O mesmo poderia se aplicar à poluição ambiental. Há uma diferença entre os sexos nesses mecanismos de reparo, mas ainda não sabemos o porquê”, diz Tiago Noguchi Machuca, cirurgião torácico e diretor nacional de medicina respiratória de alta complexidade da Rede D’Or.

A poluição do ar é uma das hipóteses investigadas para o aumento de tumores de pulmão entre não fumantes, um fenômeno observado em vários países. Um estudo publicado no periódico científico The Journal of Thoracic and Cardiovascular Surgery em fevereiro analisando 2,2 mil casos da doença mostrou que pessoas que nunca fumaram e tinham câncer de pulmão apresentaram níveis de exposição significativamente mais altos a múltiplos poluentes.

Outro estudo, este publicado na revista científica The Lancet Respiratory Medicine em abril, estimou que, dos quase 2,5 milhões de casos de câncer de pulmão identificados no mundo em 2022, 194 mil (ou quase 8%) já tinham como provável causa a poluição ambiental, uma parcela considerada significativa. Esse percentual foi ainda maior entre as mulheres.

De acordo com Jefferson Luiz Gross, líder do Centro de Referência em Tumores de Pulmão e Tórax do A.C. Camargo Cancer Center, esse novo cenário faz com que venha aumentando o número de casos de câncer de pulmão entre pessoas mais jovens.

“Antes quase todos os pacientes que atendíamos estavam na faixa acima dos 65 anos. Se pensarmos na poluição ambiental como fator, a partir do momento que você nasce você já está exposto aos poluentes, ao passo que, com o cigarro, as pessoas começam a se expor aos 15 ou 20 anos.”

Além da poluição ambiental, a exposição a substâncias tóxicas como asbesto e radônio também são apontadas pelo Inca e pelos especialistas como possível causa de câncer de pulmão entre não fumantes.

‘Nunca coloquei um cigarro na boca e tive o diagnóstico’

A advogada Adriana Barbosa Sodré, de 51 anos, é exemplo do quão desafiador pode ser esse novo cenário do câncer de pulmão. No ano passado, ela descobriu um tumor maligno ao fazer exames pré-operatórios para uma cirurgia estética.

“Levei um susto muito grande porque nunca coloquei um cigarro na boca, sempre cuidei da minha saúde, malhava diariamente, nunca fui sedentária, então você nunca imagina passar por essa doença”, conta.

Como descobriu o nódulo em um estágio muito inicial, ela passou por uma cirurgia para a retirada do tumor e se recupera bem, sem a necessidade de quimioterapia ou radioterapia. Já voltou às suas atividades físicas normalmente sem sequelas respiratórias.

Esse é um dos pontos que os médicos mais ressaltam: se descoberto precocemente, o câncer de pulmão tem chance de cura em mais de 90% dos casos. O problema é que mais da metade dos tumores do tipo no Brasil são diagnosticados em estágio avançado.

E quando considerados os não fumantes, o diagnóstico pode ser ainda mais tardio, já que essa população não se vê em risco para esse tipo de tumor. “Eu acabei tendo sorte de decidir fazer essa cirurgia estética porque, caso contrário, eu nunca teria feito esses exames e não teria descoberto esse nódulo, porque eu não tinha sintoma nenhum”, conta Adriana.

A advogada Adriana Barbosa Sodré, diagnosticada com câncer de pulmão em 2024 Foto: Divulgação/Arquivo pessoal

Diante do cenário, a Rede D’Or, por exemplo, criou há cerca de três anos um programa de acompanhamento de nódulos de pulmão incidentais. “A gente desenvolveu um algoritmo que lê os laudos de tomografias de tórax de todos os pacientes que fazem o exame nos hospitais da Rede e, se identificado um nódulo pulmonar, ele é avaliado por uma equipe especializada quanto ao risco e o paciente é contatado para investigação”, diz Machuca.

Somente nos últimos 12 meses, 612 pacientes tiveram nódulos identificados e estão em acompanhamento. Trinta deles tiveram o diagnóstico de câncer de pulmão confirmado e já foram tratados ou estão em tratamento. “A gente nunca deve deixar passar uma oportunidade de tratar um câncer de pulmão”, diz o cirurgião.

Também de olho nos novos fatores de risco e perfil de pacientes do câncer de pulmão, o A.C. Camargo passou a integrar neste ano um estudo internacional para investigar as causas desse tipo de tumor entre não fumantes. O estudo, batizado de Sherlock Lung (referência ao investigador Sherlock Holmes), é coordenado pelo Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos.

“A América Latina estava subrepresentada, então entramos neste ano e vamos enviar amostras de 30 dos nossos pacientes. Alguns estudos iniciais já mostram algumas mutações genéticas que podem estar associadas”, explica Gross.

Rastreamento para fumantes ainda é desafio

Apesar do novo cenário, os especialistas ressaltam que o cigarro ainda é o grande vilão no câncer de pulmão e lembram que a recomendação de sociedades científicas é que pessoas com mais de 50 anos fumantes ou que tenham parado de fumar há menos de 15 anos devem passar por uma tomografia anual de baixa dose. Apesar da recomendação, os cientistas estimam que somente 10% da população-alvo faça esse rastreamento.

O próprio Ministério da Saúde e o Inca ainda não recomendam esse rastreamento oficialmente e vêm estudando incorporar essa diretriz. “A gente tem feito estudos de evidência, e ações para melhorar o diagnostico precoce e diminuir o tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento. A gente não tem trabalhado com diretrizes de rastreamento porque a gente sente a necessidade de organizar a rede para que essa oferta no diagnóstico precoce seja adequada e oportunizada e consiga melhores resultados”, afirma Renata Maciel, coordenadora da área de Detecção Precoce do Inca.

Fonte: Externa

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